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Leia aqui a homenagem da Fundação António Quadros a António Telmo.



segunda-feira, 21 de junho de 2010

«SINGULARIDADES», OS EXCERTOS, 7

Ode em prosa pela Língua Portuguesa

Carlos Aurélio


(...)

II
Eu creio que as línguas têm língua, quero dizer, língua mesmo como cada homem tem a sua, se não em carne que afinal por si não faz falar pois os animais têm-na e não falam, mas, pelo menos, uma língua que é alavanca ou corda de alma como imagino a nossa. As línguas têm língua assim ao modo mais ou menos misterioso como as consoantes na boca caçam vogais, dito melhor, como as tangem e acariciam vibrando nelas como cordas de harpa ou de guitarra, portuguesa ao caso de quem isto lê. E sei pouco do que digo, ainda que admire, e muito, o que outros disseram quando um dia se puseram a pensar sobre a língua que amavam, ou melhor, sobre a língua em que amavam. Quem quiser, bem pode ir remar na epopeia de Camões, ou rimar na prosa do Padre António Vieira, ou então, cismar analogicamente com António Telmo que um dia se pôs a colher frutos de uma certa árvore sefirótica plantada na sua Gramática Secreta da Língua Portuguesa. Secreta, ali, quer dizer sagrada porque é do Céu que descem até nós as línguas, tal como no Pentecostes, dadas a todos assim o sol quando nasce que, quando se põe, já depende do que fizermos com ele.
As línguas têm língua, o sino badalo e, as flores, androceu entumecido de estames e pólen doirado. Também nós temos boca e nela a língua, cega e misteriosa, alavanca de potência espiritual a sondar o palato. É sabido e certo que o homem fala sem que esteja apetrechado de aparelho fonador específico, moldando plasticamente o ar em seu percurso vital, afinal similar ao de outro mamífero, ao de qualquer ave ou mesmo réptil. Porque não falam os gatos ou os cães? Porque não raciocinam por palavras macacos ou golfinhos? Se, ao que parece, o genoma humano é 99% igual ao código genético do chimpanzé e, todavia, só o homem fala e raciocina, não é de concluir que a diferença decisiva está precisamente no invisível espiritual que se pretende negar? Nesse 1% cabe um salto de infinito. Tudo será apenas darwinismo transformista e patamares atrasados da evolução que, em dia de “São Nunca”, dará palavras pensadas a baleias e papagaios? Quanto cientismo por desmistificar?
(...)

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