(os textos assinados são da exclusiva responsabilidade dos seus autores)

Leia aqui a homenagem da Fundação António Quadros a António Telmo.



quarta-feira, 8 de julho de 2009

ANOTAÇÕES PESSOAIS, 17

António Carlos Carvalho

Faço hoje 62 anos. Na verdade, o tempo é veloz: nem dei pela passagem dos anos, não os sinto a pesar-me cá dentro. Mas sou obrigado a fazer balanços, sobretudo negativos, destes anos. Tantos sonhos desfeitos, tantas desilusões, tantos projectos falhados ...
Ironia da História: antigamente, este era o Dia da Marinha, assinalando a partida de Vasco da Gama para a Índia, com a sua descoberta (ou reconhecimento oficial) do caminho maritimo para esse Oriente perdido. Hoje, este é apenas o dia de um aniversário de alguém cuja viagem para Oriente nunca passou de um sonho.
Lembro-me então de um vizinho nosso, peninsular, Yehudah (Judah) Halevi (1075-1141), que dizia: «O meu coração está no Oriente e o meu corpo no extremo do Ocidente.»
Este médico, poeta e pensador religioso, autor do célebre «O Kuzari», sonhava visitar a Terra de Israel, mas morreu a caminho, em Alexandria. A sua obra é essencial para entendermos o pensamento filosófico e religioso medieval na Península Ibérica, como explicou exemplarmente um dos seus maiores estudiosos: Jacob Gordin.
Por coincidência, este erudito de origem russa, depois exilado na Alemanha e em França, onde foi mestre de Léon Askénazi, morreu há 62 anos, em 23 de Agosto – em Lisboa, para onde a família o trouxera, na esperança de o salvar da sua grave doença, com o auxílio de um especialista português.
Só há pouco tempo descobri esta mente brilhante, os seus escritos, a sua obra como mestre semeador de ideias.

Também só há pouco tempo descobri realmente a obra de outro poeta oriental, o japonês Issa Kobayashi (1763 - 1827), aquele que escreveu:

«Uma gota de orvalho

A vida Uma gota de orvalho
E contudo ...»
~
«Imperfeito este mundo

E contudo

Recoberto de flores»

~

«Neste mundo
Caminhando por cima do inferno
Contemplo as flores»
~
Ontem, estranhamente a caminho de um funeral, descobri um campo semeado de girassois, em plena Lisboa.
... E dei por mim a pensar que, apesar de todas as dores e lamentos, há sempre um «e contudo» que nos incita a continuar, a sermos curiosos até ao fim. Esse «e contudo» pode assumir a forma de uma simples mas esplendorosa flor.
... E lembrei-me da «divisa» do staretz Silouan do Monte Athos: «Guarda o teu coração no inferno e não desesperes».
... E afinal de contas sempre vou fazendo algumas descobertas, aqui ao pé de casa.

5 comentários:

  1. Gostava também de deixar as minhas felicitações. Muitos parabéns.

    ResponderEliminar
  2. Caro António Carlos Carvalho,

    Ontem referi o seu nome, uma modesta forma de me referir ao Espírito que o habita, em duas situações: a primeira quando o acaso me apresentou a um Judeu Português que reside em Bruxelas a quem referi que o deveria ler, ainda que lamentavelmente quase tudo esteja esgotado; a segunda em livraria de Évora onde perguntei se teria por lá vivido na sua última visita a esta cidade...
    Parabéns a todos por o termos entre nós. Aceite um abraço sincero pelo dia de hoje.

    Helder Cortes

    ResponderEliminar
  3. Caro António,

    Um grande abraço de Parabéns!

    Paulo Júlio.

    ResponderEliminar
  4. Caro António,

    Também aqui lhe deixo um abraço de Parabéns!

    ...E felicitações pelos belos textos que tem escrito.


    Esperando vê-lo em breve,

    Pedro R.

    ResponderEliminar