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sexta-feira, 23 de outubro de 2009

NO CORAÇÃO DA ARTE, 26

Cynthia Guimarães Taveira




O Mercado
Havia os que compravam e vendiam por não saberem criar. Por não saberem ver. Por não saberem amar. O mercado era estranho para o pintor. O único que lhe fazia sentido era aquele onde as bancadas fervilhavam de cor. Laranjas, pêssegos, uvas. Uma pintura cuidadosamente arranjada pelas vendedoras de cintura grossa que cantavam os seus tesouros. O Marketing, o compra e vende, o espólio, as fundações, os valores e cotações faziam parte de uma linguagem nova que se relacionava com a arte mas nada tinha dela. No silêncio musicado do seu atelier só havia memórias, visões, desejos e a sua mão revelando facetas novas das cores, fragmentos de Deus espalhados por aqui e ali. Nesse universo não havia valores. Não havia espaço para eles, porque esgotado de etéreo, transbordava pelas janelas, pelas portas, pelas frestas, ondas e ondas desse calor, desse amor e dessa angústia fininha que percorre a paixão. Lá longe, noutro mundo, estavam homens cruzando as pernas, de gravata pendurada, olhando o horizonte com olhos tristes, enquanto na parede, atrás deles, um quadro os espreitava à espera do seu despertar.

1 comentário:

  1. MERCADO DAS CORES

    Eu gosto do Mercado. Do Mercado das cores. As cores são a Arte do Mercado. Um Mercado cheio de bancas com telas alvíssimas como a pureza, esperando, ansiosamente, que sejam desvirginadas com o amor das cores mais belas. Os pincéis, as paletes e os cavaletes, de cada uma das bancas, são os agitadores da revolução que brota do Mercado, onde cada espelho colorido é uma expressão de glória, entre as paixões que despertam em cada quadro que me consome com todas as vibrações que as cores causam neste corpo sem cor.
    Não uso gravata, não cruzo as pernas, mas tenho os olhos tristes porque não encontro o Mercado.
    Todo eu sou memórias, visões e sonhos que podem alimentar as cores do Mercado, mas não consigo fecundar a Arte das cores que o meu Mercado desconhece. Quero visitar bancas, pintores e pincéis, fustigando as telas com os escândalos das cores, varrendo fronteiras, inventando janelas abertas, abrindo portas por onde as correntes de ar provocam os espirros das liberdades coloridas. No Mercado, não há silêncios, há a algazarra saudável das paixões imparáveis que dão à luz, os incomparáveis tesouros das cores que fervilham no universo das telas eternas. Todo eu sou um mundo de bancas na Arte de um Mercado, modelado com a sensibilidade pura das cores. Finalmente, sou as cores vivas de uma cor morta.

    Oeiras, 24/10/2009 – Jorge Brasil Mesquita

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