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sábado, 19 de junho de 2010

«SINGULARIDADES»: OS EXCERTOS, 5

Linguagem e civilização no pensamento de Silvestre Pinheiro Ferreira

Charlatanismo e barbaridade no império das homonímias
versus substancialidade unívoca


Rodrigo Sobral Cunha


Notícia
Silvestre Pinheiro Ferreira nasceu em Lisboa no dia de São Silvestre a 31 de Dezembro de 1769 e aos catorze anos entrou para a Congregação do Oratório para fazer o Curso de Humanidades, que em nove anos percorria o conhecimento de todas as coisas, isto é, as respeitantes ao homem, ao mundo e a Deus e que o nosso filósofo haveria de conglobar na palavra Universo. Considerando a língua grega “o mais glorioso momento da perfeição do Espírito humano”, guiá-lo-ia a inspiração judaico-cristã, também leibniziana, de uma língua universal capaz de harmonizar os homens de todas as nações.
Terminava então no Ocidente o ciclo do clero e principiara a idade em que aparece a filosofia como experiência de liberdade enquanto reflexão sobre o Universo: em Silvestre Pinheiro Ferreira acharia assim a razão atlântica luso-brasileira o primeiro filósofo moderno e o iniciador do ciclo intelectual que sucedeu ao que teve no Padre António Vieira o momento mais significativo.
Na Alemanha, relacionou-se com os centros do saber e do poder ao longo de quase uma década, contactando até finais de 1808 com políticos, magistrados, académicos, artistas e particularmente com personalidades como Goethe, Herder, Fichte, Schelling, Karsten e Werner.
Coube-lhe o acto heróico de avisar o governo português dos planos de Napoleão para a Península Ibérica, conhecendo a perseguição pessoal do imperador dos franceses.
No Brasil, traduziu as Categorias de Aristóteles – correspondentes à ontologia e à epistemologia do filósofo lisbonense – para sistematização das Prelecções filosóficas sobre a teórica do discurso e da linguagem, a estética, a diceósina e a cosmologia (uma das primeiras obras editadas no Brasil pela Imprensa Régia a partir de 1813 e até 1820), achando no sistema categorial aristotélico “tudo quanto as luzes da moderna Filosofia talvez presumiriam ter descoberto, se as obras imortais daquele insigne Luminar da Grécia não estivessem, há tantos séculos, abertas à meditação e ensino do Universo”. Química, mecânica, cristalografia, botânica, zoologia, físico-matemáticas, termodinâmica, astronomia, história, etnografia, linguística, psicologia, pedagogia, comércio, direito, medicina – cumulativamente procurou Silvestre Pinheiro Ferreira adunar os saberes modernos aos antigos saberes segundo a taxinomia aristotélica, pelo menos, conforme veio a escrever, “em que nada falte do que a nenhum homem de uma educação liberal, é lícito ignorar”. Tanto as ciências dos reinos físicos e civis, como as ciências do reino intelectual (consoante as expressões do filósofo) são, com efeito, articuladas por ele – segundo as três categorias centrais da substância, da qualidade e da relação – em ordem à formação política, cósmica e espiritual do ser humano. Pela classificação das palavras segundo as dez categorias aristotélicas e mediante uma semiótica numérica, chega-se à gramática filosófica universal que há-de facultar a harmonização dos idiomas das diferentes nações na ecúmena do reino intelectual.
Decorrente de uma filosofia relacional, a noção silvestrina de ciência, pelo equilíbrio pentagonal de factos, nomenclatura, sistema, teoria e método, pela amplitude de conteúdos e horizontes, pelo conceito axial da ligação de todas as coisas no Universo, considera o conhecimento num grau de perfectibilidade que excede a compreensão moderna do mundo e coloca a inteligência perante a grandeza de um pensamento.

(...)

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