
MEDITAÇÃO DA NOITE
Vinha alargando a noite… Eu continuava,
Já rouco, e aos berros sem decência alguma.
Ai boca estéril, tumultuosa, e escrava!
Cuspia fumo, pó, fel, sarro, espuma…
Minh’alma aflita ouvia-me, e aguardava,
Pesando-me as palavras uma a uma:
Mas, entre tantos sons, só não ressoava
A Palavra essencial que me perfuma!
Quem me julgou – julgou-me, pois, por tudo
Menos por essa Nota inexprimida
Sem a qual nem respondo aos que me chamem…
E eu fiquei só, desconhecido, mudo,
Pairando, estranho à minha própria vida,
Per omnia secula seculorum…, amen.
José Régio
ENGANO NOCTURNO
ResponderEliminarVou atado à noite dos perfumes
Com o corpo vivo da tentação
Sem ouvir a boca do coração
Que lê no livro antigo dos ciúmes
Que sou uma pétala de cardumes
Exposta aos delírios da razão
Sem que eu conheça o que farão
As palavras de amor que assumes
Como uma asa breve que não voa
Porque todo o sonho que magoa
É a face nua do erro que corrói
A pureza do fogo que não mói
Criando ao estado que me destrói
A beleza de ser quem não me doa.
Jorge Brasil Mesquita