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Leia aqui a homenagem da Fundação António Quadros a António Telmo.



segunda-feira, 15 de junho de 2009

NO CORAÇÃO DA ARTE, 8

Cynthia Guimarães Taveira




A Luz
Consta que Turner se fechava na escuridão completa abrindo subitamente as cortinas para que a luz entrasse nos seus aposentos, subitamente, instantaneamente. A luz era um choque. Para os pintores toda a cor é luz. A sua alma está ligada à visão. A sua alma é composta por uma espécie de fios de seda, levíssimos, que se agitam mais ou menos suavemente com a intensidade das cores. A luz é a quinta essência omnipresente em todos os eixos de representação: no drama em lusco-fusco, na comédia do escarlate vibrante. A sombra é um pretexto para o seu realce. A captação das sombras nos olhares humanos é sempre o contraste com a luz que poderiam ter. Há retratos múltiplos em pinturas antigas onde o olhar desvenda inúmeros adjectivos, em sequência, ininterruptamente: aquele homem de negócios era orgulhoso, poderoso, seguro e talvez escondesse um medo. Aquela dama era jovem, ainda com não-sei-quê de criança. Nela havia vaidade, ingenuidade, provocação, frontalidade e timidez. A Gioconda gera adjectivos contraditórios, dai a filosofia zen ser possível ao contempla-la. E tudo isto com a ponta de um pincel e algumas cores. O pincel é um cálamo de luz. A partir daí todas as palavras são possíveis. Não há verbo sem luz, nem luz sem Verbo.

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