(os textos assinados são da exclusiva responsabilidade dos seus autores)

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quinta-feira, 3 de setembro de 2009

EXTRAVAGÂNCIAS, 30

Aos organizadores e colaboradores
dos Cadernos de Filosofia Extravagante
Eduardo Aroso

Em jeito da tradicional e quase extinta rubrica Carta dos Leitores, sou a enviar estas breves palavras, no estilo também do “jurássico” postal do correio, que, pela internet (sob o título de comentários) anda mais rápido, embora não tenha a tinta vibratória pessoal de quem, desta maneira, assim escreve.
Leio diariamente os Cadernos de Filosofia Extravagante, no apetite de quem vai ao café e, com a aromática bebida, vai olhando o Diário disto ou daquilo. Às vezes assalta-me a ideia de Nietzsche de que, para certo público, o jornal viera substituir a missa diária, quando me sento à mesa e peço a “bica” para logo começar a ler alguma coisa. Não o faço de modo automático ou semi-inconsciente, como actualmente acontece comigo em relação às televisões nos cafés. Ou seja, ouço mas não escuto. Se, para mim, ler o jornal não é um automatismo (pois o gesto de abrir e fechar as suas folhas constitui um acto volitivo que não posso fazer com as televisões dos espaços públicos) ler reflexivamente os Cadernos de Filosofia Extravagante é um ensejo e uma atitude de liberdade e de perfeita consciência que logo se assume numa interior atmosfera desperta: uma brisa passa, um gosto a flor silvestre ou intemporal maresia lavam-me da poluição mental, congestão de gordurosas ideias e da total ausência de alma que nos cerca por todos os lados nos chamados meios de (des) informação ou de outros de carácter pretensamente erudito.
Nos Cadernos de Filosofia Extravagante encontramos o que é português sem aportuguesamento, o liberal sem liberalização, o universal para além dos internacionalismos… Irradia, essencialmente, uma atitude do espírito, ou quando isso não acontece claramente há como que uma compulsão na procura do mesmo espírito, do mesmo modo que o peixe, fora de água, o instinto o leva a ela retornar, sob pena de perecer… Às vezes não sei se é o espírito que irradia, ou se, vindo de um absoluto disperso, converge para um todo concreto, inteligível. Na torre de Babel, a profusão dos andares só acrescenta confusão e cria condições a um inevitável sismo da matéria, mas nos Cadernos de Filosofia Extravagante não é o instinto que leva ao retorno (à espiral mais acima e mais além, entenda-se), mas o pensamento ideal e uma atitude benigna e até ocasionalmente bondosa, onde razão e amor não guerreiam ocultamente. Não há a preocupação de agradar, mas de pensar; não há incómodos estatísticos, sim o desejo do traço singular; não há o requentar de ideias, apenas – e quando não rompe a madrugada do original - o querer retomar o fio de Ariadne que leva à verdade perdida, caminhos novos para a redenção do ser. E é desejável que se faça na nau da tradição portuguesa, mesmo que nessa nau haja reparações de tempos a tempos. Mas é com ela – a que temos à mão, sem o incómodo de outra encomendar não se sabe a quem e por que preço! – que podemos ir longe. Este longe está para além do que as sociedades materialistas, na pretensão de conduzir o mundo, podem entender. Elas já nem aceitam o suor do rosto, quanto mais o verso de Camões «Mais do que permitia a força humana».
As minhas calorosas saudações a todos os que mantêm o sopro…
2-09-09 (Quase Lua Cheia de Setembro)
Eduardo Aroso

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