(os textos assinados são da exclusiva responsabilidade dos seus autores)

Leia aqui a homenagem da Fundação António Quadros a António Telmo.



quarta-feira, 15 de julho de 2009

ANOTAÇÕES PESSOAIS, 18

António Carlos Carvalho

Pelo aniversário, a Cynthia ofereceu-me o último livro do José Gil. Percebeu que eu me tinha interessado pelo livro, apresentado em conversa com o autor na SIC Notícias, e resolveu fazer-me a surpresa. Nem ela nem eu prevíamos que fosse, afinal, tão pouca coisa.
Apesar do título apelativo, «Em Busca da Identidade – o desnorte», não passa de um livrinho insignificante. Pela dimensão (62 páginas, muitas delas em branco ou quase – mas às vezes uma única página numa certa obra vale 200 numa outra ...) e sobretudo pelas ideias e pela forma.
Não vou fazer aqui uma recensão. O livrinho não merece tanto. O seu autor, doutorado em filosofia pela Universidade de Paris, onde também ensinou antes de vir fazer o mesmo para a Universidade Nova de Lisboa, tem mostrado o seu interesse pelo Portugal de hoje. Esta última obra debruça-se sobre o que considera como «doença da identidade»: «Somos portugueses antes de sermos homens – eis a doença da hiperidentidade que nos corrói.» E depois analisa em traços rápidos o caso clínico português com a ajuda do psicanalista Sandor Ferenczi. Aliás, o texto refere apenas autores estrangeiros (Michel Foucault, Antoni Negri, Gilles Deleuze, Jacques-Alain Miller, Jean-Claude Milner) e nenhum português (Pessoa é referido apenas de passagem).

Lendo estas poucas páginas do que poderia ter sido uma conferência ou um texto para ser lido em colóquio, pensei mais uma vez que não creio ser possível reflectir filosoficamente sobre Portugal sem a ajuda da nossa História (do que ela mostra e do que esconde) e sem uma visão interior desse ser espiritual que é a nação. Uma visão que seja realmente *ver* e não apenas *olhar*.
E é de olhares estrangeirados, forasteiros, como o que este livrinho mostra, que eu estou farto, confesso. Sejam eles de influência francesa ou de imitação americana, esses olhares que nos percorrem anedoticamente, cheios realmente de ideias feitas, nunca entendem (como o poderiam fazer se não falam realmente português?) o que Pessoa nos tentou dizer – gritando ao que restava da nossa alma – há 75 anos: Portugal ocultou-se, é ele o verdadeiro Encoberto. Isto que temos hoje é apenas um simulacro, uma casca, uma máscara (uma «persona») de comédia que já nem graça tem. E o povo que por aqui ainda habita, por não ter podido emigrar, alimenta-se apenas de imagens, de fantasmas animados num ecrã.

1 comentário:

  1. Apreciei o seu comentário. Quando o "rei vai nu" que haja a coragem de o dizer.

    ResponderEliminar