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sábado, 7 de agosto de 2010

JAIME CORTESÃO, 50 ANOS DEPOIS, 4

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“Num pequeno estudo, que recentemente publicámos sobre O Problema das Relações entre a Geografia e a Autonomia Política de Portugal, fizemos notar que os dois caracteres da geografia portuguesa, que mais prepararam a sua diferenciação política na Península, são aquilo a que chamamos o contacto cruciforme entre os seus diversos elementos geográficos e a convergência atlântica dos seus caracteres. Seja-nos lícito transcrever desse estudo as palavras que se lhes referem:
“«I – Assente no flanco ocidental da meseta, numa longa vertente preenchida pelas planícies de aluvião, considerado em conjunto e grosso modo, o território de Portugal realiza um contacto cruciforme entre uma série de elementos geográficos diversos: de oeste a leste, entre o mar e a planície, e entre esta e as diversas formações do seu relevo bem como do da Península; de norte a sul, entre a região de aquém do Tejo, de forte altimetria e abundante pluviosidade e irrigação, e as planícies e pleniplanícies adustas de além do Tejo. Na realidade o contacto é mais complexo e dá-se de norte a sul e de oeste a leste, entre uma diversidade riquíssima de elementos, formando uma espécie de mosaico de terrenos geológicos, de regiãos e paisagens, em contraste com a maciça uniformidade dos planaltos interiores da Península.
«II – Este contacto de elementos vários por outra forma se enriquece e, por assim dizer, ganha sentido: no seu conjunto os caracteres da constituição geográfica de Portugal unem-se naquilo a que chamaremos uma convergência atlântica:
«a) A posição geográfica de Portugal tornava os seus portos, além de estações forçadas da via marítima, que une o Sul e o Norte da Europa, as melhores escalas de comércio e navegação deste continente para a África, a América Central e Meridional e a Ásia;
«b) O território português forma uma longa faixa rectangular no sentido da fronteira atlântica, facilitando o contacto duma grande variedade de terrenos com o oceano;
«c) No seu conspecto orográfico essa longa faixa rectangular forma um anfiteatro irregular, voltado para o Atlântico, situação privilegiada de exposição que explica o seu clima temperado e marítimo e a sua riqueza fluvial. Ajustando-se a esta faixa anfiteátrica, os rios do Norte de Portugal, como o Vouga e o Mondego, descem do N.E. para S.O., e os do Sul, como o Sado e o Mira, de S.E. para N.O., dispondo-se n conjunto como as varetas de um leque a que tivessem partido as extremidades convergentes;
«d) Não só por este motivo o território português é extremamente rico de rios que nascem do seu solo; como o pendor ocidental da meseta faz que quatro dos maiores rios da Ibéria venham desaguar nas suas costas, uns e outros fertilizando o solo, abrindo portos e auxiliando a fixação humana na beira-mar;
«e) Uma grande estrada geográfica, próxima e paralela à estrada marítima, estabelece comunicação fácil entre o Norte e o Sul do País, permitindo um estreito contacto entre as populações costeiras;
«f) Finalmente o litoral era durante a Idade Média muito mais articulado: mais vastos e fundos, os estuários permitiam que o mar penetrasse até longe no interior das terras; e a costa desdobrava-se num maior número de abras e portos naturais, favorecendo uns e outros o aumento de população interessada no trabalho e no comércio marítimo.»”
Jaime Cortesão
in Os Factores Democráticos na Formação de Portugal, pp. 20-22.

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