domingo, 10 de abril de 2011
O CONTRA CAMÕES
Cynthia Guimarães Taveira
Acontece … e já ninguém comenta, e já ninguém se indigna como antigamente quando o Salazar imbuído de poder habituou as gentes a já nem estranharem, a já nem se indignarem.
Via o jornal da Sic. A reportagem era sobre o absurdo das novas regras impostas aos donos das esplanadas: a partir de agora as toalhas de mesa, os porta-guardanapos e os chapéus de sol teriam de ter regras e seriam uniformizados segundo o gosto de alguém muito rigoroso da Câmara Municipal de Lisboa.
A reportagem acabava assim: “Tentámos falar com alguns donos de estabelecimentos mas apenas um deles falou porque os outros tiveram medo de represálias”. Assim, com a maior naturalidade do mundo. Rapidamente se passou a outro tema. O medo é dado adquirido neste país. E vejo descendo por uma das sete colinas o Contra Camões envergando um estandarte onde um outro poema se agita e permanece:
Amor é fogo que arde sem se ver; Medo é fogo que arde e se vê;
É ferida que dói e não se sente; É ferida que dói e que se sente;
É um contentamento descontente; É uma resignação descontente;
É dor que desatina sem doer; É dor que desatina a doer;
É um não querer mais que bem querer; É um não querer mais que outro querer;
É solitário andar por entre a gente; É solitário calar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente; É contentar-se de descontente;
É cuidar que se ganha em se perder; É cuidar que se ganha em se calar;
É querer estar preso por vontade; É querer estar preso sem vontade;
É servir a quem vence, o vencedor; É servir a quem manda, o senhor;
É ter com quem nos mata lealdade. É ter com quem nos mata submissão.
Mas como causar pode seu favor/Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,/Nos corações humanos liberdade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor? Se tão contrário a si é o mesmo Medo
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Diz-se que a magia negra tem a estrela invertida, o que está num lado devia estar no outro, as correntes que deviam ir para o bem, são postas nos trilhos do mal, etc. O estado do mundo actual, no seu todo, é exactamente isso. Não só a perversidade mas também a ignorância no uso dos símbolos. Veja-se, por exemplo, a perversidade na utilização da palavra, ou na própria energia sexual, sagradas na essência. A força do negativo, actualmente, é tanta que qualquer acção de luz branca é logo sufocada, a menos que se conjugue com uma cadeia mais reforçada, ainda assim tem a etiqueta de duração efémera ou com vida irregular.
ResponderEliminarJá que falou de Camões, e salvo honrosas excepções, os patriotas de hoje (que já não usam a palavra, porque dela se envergonham) são anti-Camões; os artistas são anti-Beleza, ou seja, os que cultivam a aberração; os caridosos, em vez da caridade de que fala S. Paulo, são os que dão dinheiro para fugir aos impostos. A lista continuaria.
Nossa Senhora nos dê paciência.
Cumprimentos do
Eduardo Aroso