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Leia aqui a homenagem da Fundação António Quadros a António Telmo.



domingo, 22 de março de 2009

SESIMBRA, 21 DE MARÇO

Isabel Xavier, Luís Paixão e Rodrigo Sobral Cunha, ontem, durante a apresentação dos Cadernos, na sala polivalente da Biblioteca Municipal de Sesimbra.

Lançamento. “Universalidades”, o primeiro número dos Cadernos de Filosofia Extravagante, foi lançado ontem à tarde na sala polivalente da Biblioteca Municipal de Sesimbra, e a apresentação desta publicação não-periódica da Serra d’Ossa Edições esteve a cargo de três dos seus colaboradores: Luís Paixão, Isabel Xavier e Rodrigo Sobral Cunha. Com uma assistência que rondou a meia centena de pessoas, a casa encontrava-se praticamente cheia, o que, de resto, vem sendo hábito sempre que ali têm lugar iniciativas da filosofia portuguesa. Compreende-se que assim seja, quando nos recordamos de que a ligação do movimento ao velho burgo piscatório remonta aos já distantes anos quarenta do século passado, quando António Telmo e Orlando Vitorino, ainda jovens, foram viver para Sesimbra e travaram amizade com Rafael Monteiro. Também Agostinho da Silva, Álvaro Ribeiro, Afonso Botelho e Jorge Preto ali passaram, com maior ou menor regularidade, temporadas de lazer e descanso.

Luís Paixão, que deu início à sessão, fez notar que este novo projecto é fruto do magistério de António Telmo, e não deixou de salientar alguns dos traços essenciais da filosofia portuguesa: trata-se de um livre pensamento deísta, que procura conciliar a revelação e a razão, tendo sempre presente a herança das três religiões abraâmicas (judaísmo, cristianismo e islamismo). Segundo o mesmo Luís Paixão, esse traço harmónico está patente em boa parte dos artigos que integram este primeiro número dos Cadernos, revelando a existência de um “corpo de pensamento”.

A par do ensaio, a poesia é uma presença com relevo na nova publicação, onde são dados à estampa notáveis poemas de Avelino de Sousa e Isabel Xavier. Tal circunstância, aliada ao facto de ontem se ter comemorado o Dia Mundial da Poesia, deu o mote a Isabel Xavier, que nos falou da dimensão poética que perpassa o primeiro número dos Cadernos. Não só pela produção literária que neles se dá a conhecer, mas também pelo modo como certos escritos põem em evidência o diálogo fecundo que a filosofia pode estabelecer com a poesia – trata-se, de resto, de um aspecto fundamental do pensamento português. Baseando-se na sua experiência de escritora, Isabel Xavier abordou ainda o mistério da criação poética: “Há palavras que se escondem por detrás das palavras”, disse.

Depois, foi a vez de o filósofo Rodrigo Sobral Cunha, outro dos colaboradores dos Cadernos, proporcionar aos presentes na sala uma ampla panorâmica das diversas colaborações que ali podem encontrar, levantando a ponta do véu a cada uma delas. Não sem antes, em terra de pescadores, nos oferecer impressiva imagem de fulgor poético, ao comparar os Cadernos com um barco em cujo mastro, ao alto, brilha o fogo de São Telmo, e que navega no “fim do tempo”. E, fazendo notar que o Espírito Santo era referência frequente nos textos publicados, Rodrigo Sobral Cunha confessou, a propósito, sentir-se “em casa”.

António Telmo, durante a leitura de um dos poemas publicados nos Cadernos.

Na Biblioteca, a sessão haveria de terminar com a leitura, por António Telmo, de dois dos poemas publicados nos Cadernos. Mas a jornada só ficou concluída depois da plantação simbólica de uma oliveira no Castelo de Sesimbra, junto à casa onde viveu Rafael Monteiro, numa cerimónia presidida por António Telmo e marcada pela intervenção de outro dos colaboradores dos Cadernos: António Carlos Carvalho. O autor de O Triângulo Místico Português chamou a atenção para o facto, sinistro, de, em pleno Inverno, estarem já a deflagrar incêndios florestais: incêndios nocturnos! E, declarando-se monárquico, não deixou, porém, de encarecer a importância da instituição, pela Primeira República, do Dia da Árvore. Depois, retomando algumas das ideias do texto que, na véspera, aqui havia publicado, o orador cativou quantos o escutavam com palavras, de profundo significado filosófico e religioso, alusivas à Árvore. A referência ao carvalhal de Mambrê, onde três anjos beneficiam da hospitalidade deste, permitiu a António Carlos Carvalho estabelecer a ponte com a evocada figura de Rafael, que, durante as décadas em que viveu na casa do Castelo, manteve sempre uma porta aberta aos forasteiros que ali buscavam acolhimento. Não, claro que não! A escolha do dia não foi uma coincidência. Desde ontem, Dia da Árvore, há uma oliveira plantada em sua memória junto à casa onde viveu.
Coincidência é ter havido, na noite dos tempos, um lagar de azeite a poucos metros do lugar onde a árvore irá ganhar raízes, algo que só ontem ficámos a saber, pela voz de João Aldeia, Director do jornal O Sesimbrense e autor do blogue Sesimbra, um amigo da filosofia portuguesa que também foi amigo de Rafael Monteiro e que gentilmente nos cedeu as fotografias que agora são publicadas. Hoje, mais logo, em Lisboa, a inquietude prosseguirá o seu caminho.

Em baixo, à esquerda: António Telmo no momento da plantação da oliveira; e, à direita, António Carlos Carvalho, no uso da palavra.

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