(os textos assinados são da exclusiva responsabilidade dos seus autores)

Leia aqui a homenagem da Fundação António Quadros a António Telmo.



quarta-feira, 25 de agosto de 2010

ANOTAÇÕES PESSOAIS, 44

António Carlos Carvalho

Primeiro foi o meu Pai, que partiu a 14 de Junho.
Agora foi a vez do António Telmo, que nos deixou num Agosto verdadeiramente de fogo, de destruição, de mortes.
E o António Telmo foi o único Sábio que tive a oportunidade de conhecer -- na tradição judaica, que prezo e venero sem me ser dado a ela pertencer, o Sábio é mais importante do que o Pai. O ideal seria que Pai fosse também um Sábio, mas isso…
E agora, o que fazer deste duplo vazio?

Inevitavelmente, veio-me à memória esta resposta, em forma de história ou conto exemplar (como o António Telmo gostava de escrever) registado por Elie Wiesel ao falar da tradição dos Hassidim:
«Quando o grande rabi Israel Baal Shem-Tov via que uma desgraça se tramava contra o povo judeu, tinha por costume ir-se recolher num certo lugar da floresta; aí acendia uma fogueira, recitava uma certa oração e o milagre realizava-se, afastando a desgraça.
Mais tarde, quando o seu discípulo, o célebre Maguid de Mezeritsch tinha de intervir junto do céu pelas mesmas razões, dirigia-se ao mesmo lugar na floresta e dizia: Senhor do universo, presta atenção. Não sei como acender a fogueira, mas sou ainda capaz de recitar a oração. E o milagre realizava-se.
Mais tarde, o rabi Moshe-Leib de Sassov, para salvar o seu povo, ia também para a floresta e dizia: Não sei como acender a fogueira, não conheço a oração, mas consigo localizar o lugar e isso devia ser suficiente. E era suficiente e o milagre realizava-se.
Depois chegou a vez do rabi Israel de Rizsin afastar a ameaça. Sentado na sua cadeira, segurava a cabeça entre as mãos e falava assim a Deus: Sou incapaz de acender a fogueira, não conheço a oração, não posso sequer encontrar o lugar na floresta. Tudo o que sei fazer é contar esta história. Isso devia bastar. E bastava.»
(Comentário de Elie Wiesel: «Deus criou o homem porque gosta muito de histórias».)

1 comentário:

  1. Felicito-o pela argúcia de perceber António Telmo ao mais fundo da sua alma íntima.

    Um Mestre é sempre eterno.

    Saudações monárquicas e judaizantes.
    Um abraço.

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