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quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

APRESENTAÇÃO

António Cândido Franco, escritor laureado e professor doutorado pela Universidade de Évora, durante a comemoração dos 150 anos de filosofia portuguesa, organizada e animada por Pedro Martins na Biblioteca Municipal de Sesimbra, declarou que esta, a filosofia portuguesa, se tornou objecto “de uma indiferença quase generalizada”, que “vive um descrédito largo, com juízos críticos em geral negativos e movimentos declarados de antipatia”. E exemplifica com o desprezo também generalizado de que são vítimas os dois principais mentores da filosofia portuguesa: “ninguém conhece Álvaro Ribeiro, ninguém lê uma linha de José Marinho”.

Perante tal sentença, e vinda de quem vem e de onde vem, pôs-se-nos o problema, a nós, os promotores dos 150 anos de filosofia portuguesa, de como não deixar morrer um movimento que julgávamos impor-se por si próprio, tal a sua duração e o valor dos que o mantiveram no decurso de século e meio. Nós os poucos que ainda a amamos começámos a pensar naquilo que deveríamos fazer para que não se extinguisse a chama que durante tantos anos ardeu sem queimar a sarça da indiferença geral. Decidimos então mudar-lhe o nome a essa nossa filosofia. Raciocinámos assim:

Há os capitalistas da literatura e há os pobres da literatura. Aqueles têm prémios que se dão uns aos outros, são propagandeados na televisão, vendem os seus livros aos milhares, aos milhões, têm todos os editores do mundo ao dispor e, mais importante do que isso tudo, são lidos e amados.

Os segundos não têm tudo o que têm os primeiros. São os pobres. Durante 150 anos falaram, falaram, escreveram, escreveram. Hoje ninguém os ouve, ninguém os lê. Desinteresse geral, indiferença, antipatia.

Imaginámos então vários substitutos da palavra portuguesa, porque vimos que nela e não na palavra filosofia é que estava o que devemos esconder e preservar. Ocorreram-nos expressões tais como: Cadernos de uma pobre filosofia; cadernos de uma filosofia esquecida; cadernos de uma filosofia extravagante.

Escolhemos a última. Extravagante. Exactamente, extravagante. Assim ficávamos fora do mundo que não nos queria. Nós, que conhecíamos bem Álvaro Ribeiro e sabíamos compreender bem mais do que uma linha de José Marinho, na qualidade de extravagantes poderíamos continuar a escrever sobre eles, a desenvolver e a aprofundar temas por eles sugeridos, temas que a ninguém já interessam, que a vaga do actual mundo varreu, ocupada como está toda a gente somente com não morrer à fome ou com fazer mais dinheiro.
A palavra extravagante pode ser entendida em várias acepções, conforme registam os dicionários, mas aquelas que melhor se adaptam ao nosso caso são as que a fazem sinónima de estroina ou de perdulário.
Todavia, como disse o poeta, “ter um livro para ler e não o fazer” é coisa deliciosa, assim também é delicioso discretear sobre temas, formular teses e contemplar teoremas que já não dizem nada a ninguém. Perder energias, gastá-las como um estroina do espírito, cogitámos nós, não é, num certo sentido, imitar o Filho Pródigo da parábola do Evangelho?
Eram dois irmãos. O mais novo abandonou a casa do Pai; andou vagueando pelo mundo, estroina e perdulário, mas sem perder no fundo do fundo de si a lembrança da sua superior origem. Um dia regressa e o Pai recebe-o festivamente, com cânticos e com danças. O irmão indignou-se, queixou-se ao Pai: “Então eu que nunca te deixei, que tenho trabalhado para ti e junto de ti terei de suportar que o meu irmão seja assim recebido, que em vez de ser castigado seja acarinhado?”
Algum dia o mundo de Deus há-de ser dos pobres e dos vagabundos. Extravagante é uma nobre palavra. É a única que podemos opor ao articulista. Isto no momento em que recebemos a notícia de que A Razão Animada de Álvaro Ribeiro apareceu nas livrarias reeditada pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Um pobre esquecido, lembrado pelos ricos.

4 comentários:

  1. Pois que se leiam, que se olhe e se faça que o tempo é outra vez de descobrir...
    Voltar-se para dentro, inclusive numa dimesão maior da lusofonia, que é tão bom lusofonar.
    Quem lusofona mesmo que não conheça a filosofia portuguesa, mas gostando de si e de sua raizes há de no mínimo respeitá-la; e vá ler... É a Hora

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  2. O tempo urge....vamos falar claro!
    Há aqueles que trabalham "pró pratinho" e alguns que teimam na busca da luz e da verdade. Quem somos, donde viemos....torna-se um vício..manias!
    Numa época de nivelamento por baixo, por força de tudo e mais o "controle de audiências", em que lemos, ouvimos e olhamos para a televisão e ficamos sempre com a sensação que não nos dizem tudo?! Porque será?...
    Deixando de lado as teorias de conspiração...só nos resta encarar tudo isto como mais uma prova, uma dificuldade acrescida, uma responsabilidade!
    A cortina de silêncio que caíu sobre a filosofia portuguesa, desde a instauração da república, a que se seguiu a tentativa da sua venda a retalho, pelas academias, não atingiu os seus objectivos!
    Não esqueçam...o que não nos mata, torna-nos mais fortes!
    Abraço fraternal, Álvaro Teixeira.

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  3. estando presente alexandre teixeira mendes, o pensamento está "assegurado"

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  4. Bem hajam pelos vossos pensamentos.

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