Em Julho de 1969, vi as imagens difusas da chegada à Lua num televisor do quartel de Tavira. Confesso que não me entusiasmaram nem me tiraram o sono. Eles bem podiam caminhar lá na Lua mas eu sentia-me preso ali, naquele quartel sujo. Mais tarde percebi que tudo aquilo não passava de uma manobra de diversão para não vermos o que se preparava: a «conquista do espaço» para fins militares (a «Guerra de Estrelas» de Reagan) e de vigilância dos nossos movimentos e comportamentos. Claro que os cientistas e os entusiastas da ciência ficaram todos muito contentes, ainda o estão e reafirmam que isto é tudo bom para nós, que foi feito (e será) sempre para o nosso bem. Mas entretanto, lá no alto, entre nós e a Lua, colocaram aqueles muitos satélites que, sob o pretexto da melhoria das comunicações entre os seres humanos (cada vez mais solitários), servem objectivamente para vigiar o que dizemos e escrevemos nas nossas mensagens electrónicas. A mais sinistra ficção científica tornou-se realidade nestes quarenta anos e ameaça transformar-se num pesadelo ainda pior. Enquanto uns seres humanos dementes compram lotes na Lua (com vista para o Mar da Tranquilidade...), há já quem fale da fatalidade de termos de emigrar em massa para outro planeta, visto que este está já condenado... Podemos bem imaginar o que seria esta gente alucinada a colonizar um outro planeta... Curiosamente, Edgar P. Jacobs, o genial criador de banda desenhada, terminou exactamente dessa maneira a sua aventura «O Enigma da Atlântida» -- os Atlantes sobreviventes partem em naves de uma cratera dos Açores para um outro planeta, onde a sua civilização prosseguirá...

Dois homens contemplando a Lua, de Caspar David Friedrich
Quanto a mim, céptico e desconfiado de todos os chamados progressos, prefiro continuar a enternecer-me com uma noite de luar a entrar-me pela sala adentro. Ou com o efeito da Lua nos nascimentos. Ou com aqueles chineses e japoneses de alma antiga que ainda se deslocam aos lagos para ver a Lua cheia espelhada nas águas – ainda está viva a lenda do pintor-poeta que se lançou às águas para colher o reflexo da Lua e assim pereceu, poeticamente.
Lembro que, em japonês, existe uma palavra para cada tipo de Lua (por exemplo, «yunzuki» designa a Lua do início da noite). E na minha colecção de «Haikus» encontro estes:
«Mesmo a Lua não tem de saber que brilha»
«No outono da minha vida a Lua é imaculada e no entanto» (Kobayashi Issa)
«Ao luar deixo a minha barca para entrar no céu» (Kôda Rohan)
«Depois de contemplar a Lua a minha sombra volta a seguir-me» (Yamaguchi Sodô)
Finalmente, um ensinamento do Zohar: no mundo futuro, o Sol e a Lua terão a mesma dimensão. Tal como o Homem e a Mulher.
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